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quinta-feira, 29 de maio de 2025

Estou bem! Tenho dito!

Estou doente desde início de janeiro deste ano (06/01/2025). Passei por 3 tratamentos com antibióticos, sendo duas internações e por 3 procedimentos cirúrgicos (broncoscopia, pleuroscopia e implantação de um cateter port-a-cath). Várias foram as suspeitas iniciais (covid, pneumonia, tuberculose e tromboembolismo) e então no dia 20/03/2025 saiu o diagnóstico: angiossarcoma epitelióide. Um câncer raro, agressivo e com alta taxa de disseminação (30%), portanto já metastático, local-regional. A sobrevida média após o diagnóstico é de 2 a 5 anos segundo a literatura e a chance de cura de 15%. E é claro que esses números podem todos estarem errados. 

Câncer, ou neoplasia maligna, é uma palavra guarda-chuva que se refere a mais de 250 doenças. E até o momento não encontrei quase nada de consenso sobre o tema. O que achei de mais bom senso é que pode ser uma doença desencadeada por fatores de risco, por hereditariedade ou por ambos. Alguns creem que há um percentual de predisposição genética que podemos herdar do pai, da mãe ou de ambos e esses genes herdados podem ter penetrâncias maiores ou menores, mas sem determinismos. O genético pode ser suplantado pelo estilo de vida. 

Os fatores de risco são variáveis e podem operar conjuntamente. Entre eles estão: sobrecarga de estresse, conflitos emocionais, intoxicação, radiação, incidência solar, tabagismo, alcoolismo, obesidade, desnutrição e má alimentação (ultraprocessados, margarina, frituras, refrigerantes, embutidos,...).Também existem os fatores de proteção: genes de proteção e o próprio sistema imune que pode, por exemplo, desencadear a apopitose, a morte celular programada. Os principais tratamentos para o câncer são: cirurgia, quimioterapia, radioterapia e imunoterapia. 

Meu tratamento tem sido a quimioterapia. A princípio estão planejadas 12 sessões. Já fiz 6. Deu pra sentir que não é brincadeira. Vamos ver como serão as demais. Os efeitos das químios não são dos mais tranquilos. A quimioterapia nos surpreende com frequência. Uma rasteira atrás da outra. Parece ser um tratamento pior do que a doença. Um inferno. De fato, é uma intoxicação do organismo. Seus fundamentos estão em atrapalhar o processo de divisão celular e matar as células cancerígenas. O problema é que ela está longe de ser um sniper. Mata indiscriminadamente: as células que se reproduzem rápido, as do câncer, mas também as células de defesa. Isso acaba nos deixando um pouco lesados. Dormindo durante o dia e coisas do tipo. A químio é mielossupressora, afeta a produção de células sanguíneas na medula, causando, entre outros, neutropenia: uma diminuição crônica das células de defesa do sangue. 

As pessoas me perguntam: O que anda fazendo? Passando mal....essa tem sido minha principal função. Também indo muito ao banheiro. A segunda maior atividade do dia. Com uma diarreia e uma falta de apetite meio persistentes, tudo que como tenta ir embora antes de ser aproveitado. Aí vira uma coisa, custo a comer e o que como não é absorvido pelo organismo, suficientemente. 

Quase tudo cai: os cabelos, a libido, os glóbulos brancos (a imunidade), os glóbulos vermelhos, o apetite, o peso, o ânimo, a energia, a disposição...Outras coisas sobem: os gastos, o cansaço, a temperatura corporal, as dores (cabeça, coluna, corpo). 

Estou em um curso típico de quimioterapia com sinais esperados de toxicidade hematológica, pré-anêmico (desnutrição discreta), dano renal funcional leve, fígado e rins sobrecarregados e quadro inflamatório ativo (em regressão). 

O pior de todos os dias, até o momento, foi na cama o dia todo, sem conseguir almoçar, nem jantar. Com febre, diarreia, fraqueza e dores na cabeça e na coluna. Esse dia achei que ia virar um jacaré...arrumei uma gemeção sem-fim. Ainda bem que estava sozinho em casa, pois acho muito mais fácil passar mal sozinho. Quando tem alguém eu fico preocupado comigo e com a preocupação do outro comigo e nem consigo focar na minha dor.

Os sintomas tem sido muitos: alteração no paladar, apatia (por isso não tenho respondido seu whats, não é nada pessoal), atordoamento, cabeça pesada, enjoo, mal-estar, fraqueza...Coisas triviais estão começando a virar vitória. Tipo: colocar roupa pra lavar. A decadência chegando. 

Os efeitos da químio são acumulativos, aumentam de intensidade e duração. À medida que ela avança a gente tende a ficar mais debilitado. Fiz a minha sexta químio na última terça (20/05) e seus efeitos se manifestaram até ontem. Da primeira durou dois dias, o 2º e o 3º dia, da quarta, durou uma semana. 

Tenho me esforçado para cuidar de mim e dar o mínimo de trabalho. Essa tem sido a meta. Tenho tentado dar conta das minhas coisas, casa, vasilhas, gato, comida, lendo e ouvindo sobre câncer e tentando fazer algum exercício. Estou basicamente cuidando da minha saúde. Meu foco mudou e meus interesses voltaram em parte para entender essa doença e meu organismo e em especial a questão nutricional, alimentos, hidratação, suplementação e exames... 

Tenho recebido muuita ajuda, apoio e suporte, de muitas pessoas, sobretudo da minha família, da minha namorada e de um casal de amigos. Também devo ir para a casa dos meus pais nos dias mais frágeis.

Minhas emoções estão medicamentadas. Estou tomando antidepressivo, fazendo terapia e conciliado com o “destino”. Aceita que dói menos, não é? Meus sentimentos são de determinação e esperança, mas também de resignação. Vou me esforçar o máximo que conseguir e aceitar os resultados sejam eles quais forem: morte prematura, vida perrengada ou recuperação.... Estou tentando comer-beber sempre que posso e o máximo que consigo. Não baixar a imunidade para não interromper o tratamento. Que é um risco comum. Fazer algum exercício físico. E tenho a esperança de estadiar o câncer e então colocá-lo em remissão total. Luto pela cura. Vou fazer meu possível, mas também aceito ir embora, de boa. O que vier, viverei da melhor forma que conseguir. Tenho esperança de me curar. Mas também já li Schopenhauer e Cioran. Não quero cultivar falsas esperanças. Tem dias que estou mais parecido com uma música do Legião em final de carreira, tipo “A Via-Láctea”. É. A vida dá umas empinada na carroça de vez em quando, nos impedindo de prosseguir. Mas vamos que vamos. Que o Nada nos espera.

Estou bem, tenho dito! Estou bem! Mas há dias difíceis.