Filosofia: Ensino e Pesquisa

Direitos Fundamentais e Democracia!

terça-feira, 25 de agosto de 2015

O Valioso Tempo dos Maduros - Mário de Andrade


Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora.

Tenho muito mais passado do que futuro.

Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas..

As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.

Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.

Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.

Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.

Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.

Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos.

Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário geral do coral.

As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos.

Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa…

Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade,

Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,

O essencial faz a vida valer a pena.

E para mim, basta o essencial!

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Declaração Universal dos Direitos Animais


Preâmbulo

Considerando que todo o animal possui direitos; Considerando que o desconhecimento e o desprezo desses direitos têm levado e continuam a levar o homem a cometer crimes contra os animais e contra a natureza; Considerando que o reconhecimento pela espécie humana do direito à existência das outras espécies animais constitui o fundamento da coexistência das outras espécies no mundo; Considerando que os genocídios são perpetrados pelo homem e há o perigo de continuar a perpetrar outros; Considerando que o respeito dos homens pelos animais está ligado ao respeito dos homens pelo seu semelhante; Considerando que a educação deve ensinar desde a infância a observar, a compreender, a respeitar e a amar os animais,


Proclama-se o seguinte


Artigo 1º
Todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os mesmos direitos à existência.

Artigo 2º
1.Todo o animal tem o direito a ser respeitado.
2.O homem, como espécie animal, não pode exterminar os outros animais ou explorá-los violando esse direito; tem o dever de pôr os seus conhecimentos ao serviço dos animais
3.Todo o animal tem o direito à atenção, aos cuidados e à proteção do homem.

Artigo 3º
1.Nenhum animal será submetido nem a maus tratos nem a atos cruéis.
2.Se for necessário matar um animal, ele deve de ser morto instantaneamente, sem dor e de modo a não provocar-lhe angústia.

Artigo 4º
1.Todo o animal pertencente a uma espécie selvagem tem o direito de viver livre no seu próprio ambiente natural, terrestre, aéreo ou aquático e tem o direito de se reproduzir.
2.toda a privação de liberdade, mesmo que tenha fins educativos, é contrária a este direito.

Artigo 5º
1.Todo o animal pertencente a uma espécie que viva tradicionalmente no meio ambiente do homem tem o direito de viver e de crescer ao ritmo e nas condições de vida e de liberdade que são próprias da sua espécie.
2.Toda a modificação deste ritmo ou destas condições que forem impostas pelo homem com fins mercantis é contrária a este direito.

Artigo 6º
1.Todo o animal que o homem escolheu para seu companheiro tem direito a uma duração de vida conforme a sua longevidade natural.
2.O abandono de um animal é um ato cruel e degradante.

Artigo 7º
Todo o animal de trabalho tem direito a uma limitação razoável de duração e de intensidade de trabalho, a uma alimentação reparadora e ao repouso.

Artigo 8º
1.A experimentação animal que implique sofrimento físico ou psicológico é incompatível com os direitos do animal, quer se trate de uma experiência médica, científica, comercial ou qualquer que seja a forma de experimentação.
2.As técnicas de substituição devem de ser utilizadas e desenvolvidas.

Artigo 9º
Quando o animal é criado para alimentação, ele deve de ser alimentado, alojado, transportado e morto sem que disso resulte para ele nem ansiedade nem dor.

Artigo 10º
1.Nenhum animal deve de ser explorado para divertimento do homem.
2.As exibições de animais e os espetáculos que utilizem animais são incompatíveis com a dignidade do animal.

Artigo 11º
Todo o ato que implique a morte de um animal sem necessidade é um biocídio, isto é um crime contra a vida.

Artigo 12º
1.Todo o ato que implique a morte de um grande número de animais selvagens é um genocídio, isto é, um crime contra a espécie.
2.A poluição e a destruição do ambiente natural conduzem ao genocídio.

Artigo 13º
1.O animal morto deve de ser tratado com respeito.
2.As cenas de violência de que os animais são vítimas devem de ser interditas no cinema e na televisão, salvo se elas tiverem por fim demonstrar um atentado aos direitos do animal.

Artigo 14º
1.Os organismos de proteção e de salvaguarda dos animais devem estar representados a nível governamental.
2.Os direitos do animal devem ser defendidos pela lei como os direitos do homem.

Fonte: Wikipedia

domingo, 23 de agosto de 2015

Por uma solução de conflitos real, efetiva e humanizada

Antonio Ferreira Marques Neto

Introdução

Michel Foucault, pensador e epistemólogo francês, na sua obra “Vigiar e Punir”, publicada em 1975, nos possibilita compreender um pouco mais a evolução histórica do Sistema Penal francês em particular e europeu e ocidental em geral. Foucault fez a análise e denúncia da história e de seu tempo, limitado pelo material que pesquisou e pela vida que teve, assim como todos nós.
Hoje no Brasil, como é tratada a criminalidade? Quais são seus índices? Visamos sustentar a afirmação, com dados e argumentos, de que o sistema penal brasileiro não é a expressão do interesse geral. A razão que orienta seu funcionamento não pode ser universalizada, por reduzir a complexidade e não incluir a totalidade dos interesses. No estado de arte atual do conflito de intereses da sociedade brasileira pode se constatar seletividade, guardado as devidas proporções, na criminalização, na vitimização e a na policização. As classes dominantes impõem as classes subalternas uma guerra fraticida.

O Sistema Penal Brasileiro

A criminalização é o resultado de processos de definição e seleção que escolhem determinados indivíduos aos quais se atribui status de criminoso. Esses processos se realizam por três fases distintas: a criminalização primária (criação dos tipos penais), a criminalização secundária (atuação da Polícia, Ministério Público e Poder Judiciário) e, por fim, a criminalização terciária (ingresso de indivíduos no sistema prisional). A criminalidade, do ponto de vista das definições legais, se manifesta em todos os estratos sociais, mas a incriminação não é igualitária. Estudos sobre a cifra oculta (a diferença entre a criminalidade real e a criminalidade aparente) e a criminalidade de colarinho branco (aquela praticada por pessoas pertencentes aos mais altos estratos sociais, quando em exercício de atividades econômicas empresariais, políticas e ambientais) revelaram que a prática de delitos é mais comum do que afirmam as estatísticas oficiais. Criminaliza-se certas pessoas e não ações legalmente definidas como crime. Os grupos poderosos impõem ao sistema uma imunidade que os torna quase que totalmente impunes. Os pobres não tem uma maior tendência para delinquir, mas tem maiores chances de serem criminalizados e etiquetados como criminosos. Os bens negativos (etiquetamento e encarceramento) são distribuídos na razão inversa da distribuição de bens positivos (o status social, fama, patrimônio, privilégios, etc.). Os desvios praticados por pessoas de alto status sócio-econômico raramente são perseguidos. O sistema penal atua, deste modo, em forma de funil, no qual há uma larga base que representa o conjunto de desvios e uma pequena ponta que representa a parcela da população que recebe a etiqueta de criminoso. A cada etapa do processo de criminalização, recruta alguns e deixa outros de fora. A cada fase de criminalização, acionam-se mecanismos de seleção que propiciam que determinadas pessoas sejam protegidas do processo de criminalização enquanto outras têm maiores chances de chegar ao seu último nível, que é o encarceramento. A criminalização e especialmente o encarceramento, bens negativos, recaem sobre as classes sociais mais pobres e sobre as etnias sobre as quais pesa preconceito racial, enquanto os estratos sociais mais favorecidos da sociedade são imunizados a esse processo. A investigação de crimes contra o sistema financeiro nacional é morosa e desaparelhada. O tempo médio gasto com a apuração desses delitos é de grande e o número de peritos com conhecimento profundo do mercado financeiro é pequeno, decorrendo em alto índice de arquivamento de inquéritos e de rejeição de denúncia. Já na criminalização do furto, a grande maioria das investigações se resume ao auto de prisão em flagrante. (BARRETO, 2007, p.72-103).
Neste sentido, o sistema penal brasileiro, não é um sistema de proteção de direitos humanos, mas sim um sistema que está estruturado para a violação sistemática dos direitos humanos. Ele pode ser definido como um conjunto de práticas seletivas de controle, criminalização, dominação e extermínio da população pobre, negra e indígena.
Este sistema causa sofrimento e custa vidas humanas. Ele funciona para a manutenção do status quo. Ele está baseado em uma falsa causalidade social, opera em um ritmo extremamente reduzido onde não deveria operar, reproduz estereótipos criminais e estigmas, contribui para a reprodução e reforço das desigualdades sociais, , opera com níveis altos e intoleráveis de violência oficial e extra-oficial, funcionando, deste modo, com uma eficácia invertida, violando princípios que deveria proteger. (Andrade, Vera Regina Pereira de, 2007 apud BARRETO, 2007, p.13-14)
O sistema criminal brasileiro é um sistema de escassa eficácia, com graves efeitos negativos, degrada um grande número de pessoas (tanto aquelas que sofrem a violência quanto aquelas que a exercem), é uma constante ameaça aos âmbitos sociais de auto-realização; permite um ilimitado crescimento do poder de vigilância sobre toda a população e fomenta e condiciona atividades ilícitas. (ZAFFARONI et alii, 2006, p.74 - 76)
A lei e a maneira de aplicá-la servem aos interesses de uma classe. Uma categoria social encarregada da ordem sanciona outra fadada à desordem. A lei é feita por alguns e se aplica a outros. Em princípio ela obriga a todos os cidadãos, mas na prática se dirige principalmente às classes mais numerosas e menos esclarecidas e não a todos da mesma forma. Toda a liturgia punitiva da pobreza, toda a gestão diferencial das ilegalidades por intermédio da penalidade faz partes de mecanismos de dominação. (FOUCAULT, 2011, p.258 e 261)

Perfil Predominante da Clientela do Sistema Penal Brasileiro

A seletividade do sistema penal brasileiro pode ser constatada, entre outros modos, pelo perfil predominante de sua clientela. Em 2004, havia quase meio milhão de pessoas, encarceradas em cerca de 1.500 instituições no país. A grande maioria dos prisonizados o são, não por serem autores de fatos graves tais como homicídios, estupros, etc mas por delitos grosseiros e até insignificantes. São em geral pessoas com menos privilégio e, portanto mais vulneráveis. São pessoas pobres, de baixa renda, desempoderados, pertencentes aos mais baixos estratos sociais, uma posição social desvantajosa. Suas características pessoais se enquadram nos estereótipos criminais: como cor da pele, origem étnica, corte de cabelo, estilo de vestuário, etc . São predominantemente homens (80%), jovens (60% até 29 anos), negros, desempregados, possuem pouca educação (possuem escolaridade primária embora oito anos escolares sejam garantidos constitucionalmente), suas ações ilícitas são de fácil detecção (alto índice de flagrante), cometidos com fins lucrativos (delitos contra a pequena propriedade - bens de pequeno valor) e o pequeno tráfico de drogas, ou seja, a obra tosca da criminalidade), possuem maior tendência a confessar, possuem alto índice de reincidência e na reincidência se é mais severamente punido e não possuem condições de contratar advogado particular (os réus que constituem advogado particular saem mais cedo da prisão se comparados aos que foram patrocinados pela defesa pública). (BARRETO, 2007, p.77 – 101; Mir, 2004 apud Primeiro Encontro Popular Pela Vida e por um outro Modelo de Segurança Pública); ZAFFARONI et alii, 2006, p. 47).

A Polícia

A polícia é a primeira instância da criminalização secundária, e a agência que atua com maior discricionariedade. Ela é a principal responsável pela identificação (seleção) dos sujeitos que irão ingressar no controle formal. Na prática, em geral, a polícia desobedece às normas e age orientada por moralismos e ideologias. Seu controle verticalizado-militarizado é exercido de um modo tão arbitrário quanto desregrado e que lhes proporciona um poder muitíssimo maior, punitivo, subterrâneo, paralelo e enormemente mais significativo do que o legalmente atribuído à elas. São suas práticas recorrentes a detenção arbitrária de suspeitos, sob o argumento de prevenir e vigiar para a segurança ou investigação e conforme relatório preliminar de Philip Alston, relator da ONU para execuções sumárias e extra-judiciais apresentado àquela organização em maio de 2009, no Brasil, os policiais matam em e fora de serviço porém, pouca ou nenhuma investigação é feita a respeito, já que quase tudo se justifica a partir dos autos de resistência, isto é, suposta morte em confronto. A maioria dos casos são classificados como situação de "resistência seguida de morte" e a investigação se concentra no histórico de vida do morto. Estes profissionais, no Brasil, estão a serviço das lutas competitivas das classes hegemônicas. (Zaffaroni, 2001, p. 150-151 apud BARRETO, 2007, p.110 e ZAFFARONI et alii, 2006, p.52)
Por outro lado, a polícia é obrigada a assumir atitudes antipáticas, a sofrer isolamento e desprezo, a sobrecarregar-se de um estereótipo estigmatizante, a submeter-se a uma ordem militarizada e inumana, a correr consideráveis riscos de vida e a correr maiores riscos de criminalização que todos os demais operadores do sistema penal. Não somente a criminalização e a vitimização são seletivas como também, guardado as devidas proporções, a policização. Este também é um processo de assimilação institucional violador dos direitos humanos e que recai preferentemente sobre homens jovens das camadas pobres da população, vulneráveis a tal seletividade na razão direta dos índices de desemprego. Se considerarmos que os criminalizados, os vitimizados e os policizados (ou seja, todos aqueles que sofrem as consequências desta guerra) são selecionados nos estratos sociais inferiores, cabe reconhecer que o exercício do poder estimula e reproduz antagonismos entre as pessoas desses estratos mais frágeis, induzidas, a rigor, a uma auto-destruição. (ZAFFARONI et alii, 2006, p.57 -58)

O Cárcere

A prisão faz o mal que deveria combater. A prisão, o cárcere, o presídio, a cadeia encerra múltiplas formas de violência. Nesses locais, degradados e degradantes, se mantêm, se fabrica e se reproduz, direta e indiretamente, com eficácia, no seu interior e na população, aquilo a que se deve opor: morte, ferimento, violência física, violência psíquica, fome, frio, privações, superlotação. A gestão do Estado, em específico do seu sistema penal, induz à reincidência, transforma o infrator ocasional em delinquente, consolida uma carreira criminal, perpetua relações sociais de desigualdade. (Baratta, 1991 (a), p. 89 e 116 apud ANDRADE, 1996, p.282 e FOUCAULT, 2011, p.241-263)
O seu funcionamento se desenrola no sentido do abuso de poder arbitrário da administração.

“...o sentimento de injustiça que um prisioneiro experimenta é uma das causas que mais podem tornar indomável seu caráter. Quando se vê assim exposto a sofrimentos que a lei não ordenou nem mesmo previu, ele entra num estado habitual de cólera contra tudo o que o cerca; só vê carrascos em todos os agentes da autoridade: não pensa mais ter sido culpado; acusa a própria justiça.” (Préameneu, 1819 apud FOUCAULT, 2011, p.252)

Quando sai da cadeia, a estigmatização social exige daquele que cometeu um crime que ele seja permanentemente um criminoso. (MORIN, 2005, p.117) A impossibilidade de encontrar trabalho está entre os fatores mais frequentes de reincidência, pois na qualidade de ex-presidiário se é recusado em quase toda parte. (FOUCAULT, 2011, p.254).
Mas como deveria ser a cadeia? O que ela deveria possibilitar? A cadeia não deveria ser! Não deveria ser necessária. Mas elas existem. Então hoje, como deveriam ser na sua concretude cotidiana? Primeiramente para poucos, limitada aos que estão em óbvia ameaça ao convívio social. No mais deve ser apenas uma “privação de liberdade” terapêutica-educacional. Um espaço de educação e instrução geral e profissional, de esporte e de trabalho que permita a pessoa melhorar. Um lugar efetivamente corretor, readaptativo, de transformação do comportamento do indivíduo no sentido de devolvê-los à liberdade, aptos a nela viver, de modo ético. Visando o bem comum.
                                                                                
O Judiciário e o Ministério Público

O judiciário e o ministério público também contribuem para que o sistema de justiça criminal atue de forma seletiva. Eleger os crimes a serem investigados, escolher as pessoas que serão abordadas na rua, avaliar provas, dar conteúdo a normas, fazer o exercício de subsunção entre o fato e a previsão legal, são todos, atos que revelam a discricionariedade e a atuação seletiva de policiais, promotores e juízes em conjunto. (BARRETO, 2007, p.76).
No ministério público a discricionariedade está presente no momento de valorar as provas para propor a ação penal, bem como as tipificações culturais (second codes) aparecem quando o ministério público toma decisões como recorrer, pedir a condenação ou se pronunciar sobre a liberdade do réu. Decisões favoráveis ou desfavoráveis serão guiadas por tipificações culturais que os juízes têm em suas mentes, de forma que pessoas que praticaram condutas em circunstâncias semelhantes podem ser diferentemente sentenciadas. Pesquisas demonstram que a discricionariedade do juiz funciona sistematicamente em desfavor dos réus de mais baixo poder econômico-social. São eles que preenchem as listas de condenação e que sofrem as penas mais drásticas. Inversamente, as elites e classes médias dificilmente são condenadas e, quando isso ocorre, a pena de prisão é raramente aplicada. (Baratta, 2002, 176-178 apud BARRETO, 2007, p.78).

O princípio da presunção de inocência e sua violação na criminalização do furto

No sistema penal brasileiro ocorre com frequência a violação ao princípio da presunção da inocência, isto, relativo aos três mecanismos que, em tese, deveriam favorecer a sua observância: o controle judicial das decisões decorrentes do flagrante, a celeridade procesual e o respeito ao prazo máximo de prisão provisória.
O princípio da presunção de inocência é hoje reconhecido como a exigência de que: exista uma jurisdição penal que obedeça aos postulados da ampla defesa e do contraditório; de que a dúvida não é suficiente para desconstruir a presunção da inocência do acusado; de que o ônus da prova deve recair sobre a acusação; e de que o suspeito ou acusado deve ser tratado como inocente até o trânsito em julgado de sua condenação e, como consequência, a não admissão ou restrição de imposição de medidas constritivas da liberdade individual durante o curso do processo.
Há autores que sustentam a ilegitimidade da prisão provisória em face do princípio da presunção de inocência. Entretanto, apesar de condenarem o excesso no uso desse poder e de fazerem projeções para sua extinção, os tratados internacionais de Direitos Humanos admitem a possibilidade da prisão provisória e, para tanto, disciplinam o seu uso sob quatro grupos de exigências: a) requisitos materiais que autorizem a prisão; b) controle judicial da prisão; c) condições materiais do cumprimento da privação de liberdade; e d) limitação temporal do cumprimento da medida privativa. Sobre o item a): exige-se que a privação provisória da liberdade tenha fim processual, ou seja, a prisão provisória apenas pode ser utilizada para a garantia do processo penal, apenas em casos excepcionais (a regra deve ser a liberdade ambulatória); deve ser no mínimo proporcional à pena que se espera, que haja provas de materialidade do crime e de sua autoria e que dure apenas enquanto seus pressupostos existirem. (BARRETO, 2007, p.32-57)
Apesar disto há altas taxas de encarceramento provisório. Segundo informa o Ministério da Justiça (2005), em dezembro de 2004 havia 86.766 presos provisórios no sistema prisional brasileiro, que representavam 33,03% do total de internos. (BARRETO, 2007, p.67).
Em geral, o prazo máximo de prisão provisória não é respeitado ocorrendo a desproporcionalidade e a antecipação da pena. Independente da necessidade da prisão, as pessoas permanecem presas por inércia, por dias ou meses, por simples falta de apreciação judicial que avalie a necessidade de sua custódia. O funcionamento dos órgãos judiciais são ideologizados e padecem de inúmeras disfunções burocráticas como o excesso de formalismo e de papelório e regulamentos desnecessários. (Merton apud Chiavenato, 1993, p. 29-32 apud BARRETO, 2007, p.94);
Quando ocorre excesso de tempo de prisão provisório, os presos ficam impossibilitados de usufruírem do direito à progressão de regime e o regime aplicado muitas vezes é menos severo do que a prisão provisória. A pena privativa de liberdade seria executada em tempo inferior ao que o réu permaneceu recluso provisoriamente. (BARRETO, 2007, p.60 – 63).

A Mídia                          

O Brasil apesar de estar entre as dez maiores economias mundiais tem um dos maiores índices de desigualdade social e IDH acima do 70º lugar. Aqui há grande concentração de poder e propriedade. Assim como o poder político-econômico é monopolizado, os meios de comunicação também o são[1]. A mídia corporativa também cumpre seu papel na criminalização, etiquetamento e estigmatização seletiva.
Ela da alta visibilidade midiática aos atos mais grosseiros cometidos por pessoas sem acesso positivo à comunicação social. Esse acesso negativo à comunicação social contribui para criar um esteriótipo no imaginário coletivo e ocultar a seletividade do sistema penal, pois fixam uma imagem pública do delinqüente com componentes de classe social, étnicos, etários, de gênero e estéticos e o esteriótipo acaba sendo o principal critério seletivo da criminalização secundária. As corporações midiáticas com discursos incoerentes, simplistas e contraditórios constroem uma compreensão fragmentada e distorcida da realidade, administram os medos e induzem ao pânico, fazendo a violência ser reproduzida num círculo vicioso e sem fim. (ZAFFARONI et alii, 2006, p.45-63)

Quais as causas dos crimes?

Esta pergunta não parece ter uma resposta simples e muito menos única. Deve se avaliar cada caso, mas em termos gerais, no Brasil, podemos dizer que a criminalidade, está ligada à esclerose das estruturas sociais, à reação social ao caráter violento e injusto da desigualdade social, da marginalização e da subcidadania. O poder econômico gera violência ao excluir da economia, por meio do desemprego e do subemprego, grandes porções da população. As condições para crescimento e desenvolvimento para todas as pessoas estão ausentes, não por escassez real, mas artificial, porque os bens e recursos são apropriados seletivamente.
Mas mesmo em sociedades cuja desigualdade é mínima e a situação econômica é favorável para a grande maioria, ainda assim, mesmo que em bem menos quantidade, há a ocorrência de crimes. Os motivos pelos quais se pratica crimes podem ser muitos e possuírem combinações diversas: anomalia, cólera, desejo, enfermidade, delírio, hereditariedade, impulso, inadaptação, inconsciente, instinto, loucura, maldade, meio ambiente, necessidade, paixão, perversão, pulsão, reação psicótica, repressão, temperamento, tendência, vício e vontade livre e consciente...A ênfase pode estar mais no indivíduo ou mais na sociedade....Seja como for, nossos objetivos não podem se justificarem eticamente se não forem no sentido de diminuirmos a dor e o sofrimento no mundo.

Objetivos e Soluções

Vingança não é justiça. O delito não deve ser retribuído. Porque não é justo aplicar sofrimento as pessoas e nem é eficaz, pois o castigo não impede a reincidência. Infligir dor desnecessariamente perpetua relações desumanas. Rebaixar e humilhar diminui o poder de recuperação das pessoas. Não impediremos as pessoas de continuarem causando sofrimento fazendo-as sofrer. “Uma primeira conquista de civilização está em interromper o ciclo da vingança.” (MORIN, 2005, p.125) A solução dos nossos conflitos deve ser humanizada e humanizadora. Que cada um e todos nós, possamos buscar nas nossas esferas de atuação as alterações possíveis. Precisamos de soluções reais e eficazes. Isto só é possível pela construção de uma massa crítica capaz de fazer as coisas funcionarem do melhor jeito que podem funcionar.
Precisamos, neste sentido, não só impedir o aumento do encarceramento, impedindo a Redução da Idade de Maioridade Penal, como melhorar o funcionamento deste  Sistema e fazer recuar o encarceramento existente. As soluções e objetivos necessários são muitos. Alguns possíveis:
·         Reduzir a violação à presunção de inocência; reduzir as taxas de encarceramento provisório; dar celeridade nos atos processuais e obedecer o limite máximo para a duração da prisão provisória;
·         Avaliar e reavaliar, sempre que preciso e com perspectiva aberta à inclusão de novas variáveis, as definições do comportamento criminal produzidas pelas instâncias do sistema (legislação, dogmática, jurisprudência, polícia e senso comum);
·         Tornar os poderes (Legislativo, Executivo, Judiciário e Ministério Público) transparentes, acessíveis e submetidos aos intereses emancipatórios da população;
·         Atacar as causas da miséria e da pobreza e não os miseráveis e os pobres;
·         Elaborar novas políticas de controle das situações problemáticas ou socialmente negativas substituindo as formas violentas e cruéis por práticas restitutivas que reparem a vítima e por práticas informativas-educacionais e terapêutico-assistenciais que sirva para todos, vítimas e agressores;
·         Incluir o furto simples, de coisas de pequeno valor, no rol de crimes de menor potencial ofensivo, por meio da regulamentação do inciso I do art. 98 da Constituição Federal de 1988. O parágrafo único do art. 69 da Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, prevê que ao autor de crime de menor potencial ofensivo não será imposta prisão em flagrante, nem exigido pagamento de fiança, caso ele assuma o compromisso de comparecer a juízo. Como a prisão decorrente do flagrante é o principal fator que motiva a prisão provisória, há grandes chances de que a extensão dessa medida aos réus de furto provocaria mudanças significativas no quadro prisional brasileiro. (BARRETO, 2007, p.115-122);
·         Reconhecer que a guerra às drogas tem causado muito mais danos que as próprias drogas, sendo necessário tratar esta questão como problema de saúde pública e não como problema de política criminal. Quanto mais danosa uma substância mais motivos a sociedade tem para que sua produção, comércio e consumo não ocorra nos subterrâneos, daí a importância de pautar a regulamentação das substâncias ilícitas, conforme sugere a LEAP: Agentes da Lei contra a Proibição. (KARAM, 2014);

Bibliografia:

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Do Paradigma etiológico ao paradigma da reação social: mudança e permanência de paradigmas criminológicos na ciência e no senso comum. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996, n.14, p. 276-287.
BARATTA, Alessandro. Criminología y Sistema Penal (Compilación in memoriam). Reimpresión. Editorial IB de f. Montevideo. Buenos Aires:Julio César Faria – Editor, 2006.
BARRETO, Fabiana Costa Oliveira. Flagrante e prisão provisória em casos de furto: da presunção de inocência à antecipação de pena. São Paulo: IBCCrim, 2007.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acessado em: 31/07/2015.
BRASIL. Lei Nº 9.099, de 26 de Setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9099.htm> Acessado em 31/07/2015.
CARVALHO, Salo. Criminologia e transdisciplinaridade. In: Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, n. 56, pp. 308-333.
FOUCAULT, Michel. “Os intelectuais e o Poder. Conversa entre Michel Foucault e Gilles Deleuze” (pp.69-78) In: FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. 1972.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. 39. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011. Do original em francês: Surveiller et punir.
IDEOLOGIA DA DEFESA SOCIAL. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2015. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Ideologia_da_defesa_social&oldid=42674133>. Acesso em: 21 jul. 2015.
LYRA FILHO, Roberto. Carta aberta a um jovem criminólogo: teoria, práxis e táticas atuais. Revista de Direito Penal. Rio de Janeiro, v. 28, 1979, p. 05-25.
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MIR, Luis. Guerra Civil? Estado e trauma. São Paulo, Geração, 2004. 962p apud Primeiro Encontro Popular Pela Vida e por um outro Modelo de Segurança Pública. In: http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2009/08/451891.shtml (acessado em 16/08/2009)
MORIN, Edgar. O Método. Vol 6. Porto Alegre: Sulina, 2005.
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ZAFFARONI, Eugenio Raúl. La criminologia com curso. In: Política criminal, derechos humanos y sistemas jurídicos en el siglo XXI. Buenos Aires: Depalma, 2001, pp. 925-953.
____________, La ingeniería institucional criminal. Sobre la necesaria interdisciplinariedad constructiva entre derecho penal y politología. In: Revista Brasileira de Ciências Criminais, nº 29. São Paulo: IBCCrim, 2000.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alesjandro; SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro – I. 3ª Ed .Rio de Janeiro: Revan, 2006.

Videografia:

KARAM, Maria Lúcia (Presidente da LEAP Brasil). Proibição das drogas causa violência. Fala apresentada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania no Senado Federal Brasileiro em 20 de maio de 2014. Brasil, 15 min. Acessado em 30/07/2015. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=pyA0Ubs28Ww>.
NIVEN, Rodrigo Mac (Direção). Cortina de Fumaça. Brasil, 2010, 88 min. Acessado em 30/07/2015. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=Y5TlISM_98E>.






[1]    Para ver dados e estatísticas sobre a mídia brasileira, sugiro o trabalho realizado no site: http://donosdamidia.com.br

Bogotá proíbe definitivamente veículos com tração animal

Após uma batalha legal de mais de dois anos, os últimos 90 cavalos e burros explorados em veículos de tração foram entregues para as autoridades de Bogotá, na Colômbia. A partir do primeiro dia de Janeiro, os animais encontrados nesta situação serão resgatados de seus tutores, segundo informação dada pela prefeitura. As informações são do El Mundo.
Um decreto de 2010 fixada o dia 31 de janeiro de 2012 como o limite para os grandes municípios colombianos buscarem alternativas ao uso de carretas sob exploração animal, para acabar com esta característica anacrônica do meio urbano, que é o abuso animal para meios de transporte. Entretanto, a capital do país demorou cerca de dois anos para implementar a norma.
Em pleno século XXI, Bogotá, cidade com oito milhões de habitantes, com um aumento crescente de veículos motorizados e sob um processo de modernização, era uma das últimas capitais latino-americanas onde a convivência entre veículos motorizados e de tração animal era comum.
Há dois anos, 2500 carroças circulavam diariamente pela cidade, segundo o censo da Prefeitura, dedicadas à transportar seus tutores e carregar cargas para reciclagem, comumente.
Atualmente, há menos de uma semana da norma entrar em vigor, os últimos carroceiros entraram no programa da Prefeitura para substituírem seus animais por veículos motorizados, e entregá-los a órgãos responsáveis pelos cuidados até o fim de suas vidas. O plano de negócios para a troca dos animais é de cerca de 21 mil reais.
Os tutores que não se adequarem à norma receberão multas além de terem os animais retirados de sua guarda.
Cavalos são explorados até a morte em veículos de tração. (Foto: ONCA)
Cavalos são explorados até a morte em veículos de tração. (Foto: ONCA)
Os cavalos explorados em veículos de tração são obrigados a trabalhar sem períodos de descanso ao longo do dia por meio de instrumentos de tortura, como chicotes e pedaços de pau, que são usados cada vez que o cavalo interrompe seu trajeto por já estar exausto, ou simplesmente quando não obedece as ordens de seu tutor.
Pelo trabalho pesado e ininterrupto, estes animais estão fadados a sofrer de desnutrição, desidratação, doenças pulmonares (devido à fumaça proveniente de automóveis que respiram), doenças de pele, ferimentos espalhados por cada canto do corpo que recebeu os golpes de chicote ou do pedaço de pau, além do desgaste dos cascos devido ao atrito com o asfalto.
Não há justificativa ética nenhuma para a exploração destes animais e o próprio projeto prevê a reinclusão dos carroceiros no mercado de trabalho e na sociedade, com novas qualificações que garantirão seu sustento de forma digna e sem crueldade.
Do ponto de vista econômico, o Cavalo de Lata é uma solução que se encaixa perfeitamente no lugar do abuso desumano cometido pelos carroceiros. Se trata de um veículo elétrico, que é carregado com energia solar, portanto, não emiti resíduos tóxicos para a atmosfera terrestre, tem 60 km de autonomia e exige um gasto médio somente de R$ 0,02 a R$ 0,05 por quilômetro percorrido.
Em relação ao trânsito, não é seguro para um animal percorrer ruas movimentadas ao lado de carros, caminhões e motocicletas em alta velocidade. Com a proibição de veículos com tração animal, além da própria segurança do cavalo que seria utilizado, também se preza pela segurança das pessoas, já que se evita qualquer tipo de acidente – muitas vezes fatal – com carroças e charretes.
Fonte: ANDA

Religião se discute! - Antonio Marques


A religião é um objeto de estudo da filosofia. Ao estudarmos ética, lógica, metafísica e epistemologia estamos estudando componentes de qualquer visão de mundo, portanto das visões religiosas de mundo também.

Religião se discute, futebol se discute, política se discute, se discute a discussão, se discute os que não querem que exista o discutir, se discute tudo na Filosofia. Inclusive a própria necessidade da filosofia. Temos que falar das religiões também porque na medida que geram comportamentos, escolhas, políticas...interferem na vida coletiva. Por isto a necessidade de pautar toda a cultura e mostrar onde há injustiças, inverdades, ilusões,...Fazer a crítica pode ser doloroso e desgastante mas é importante para o avanço do coletivo em todos os níveis, seja no de buscar a verdade seja no de buscar a vida boa para todas e todos.

Em geral, cada um quer falar da sua crença, mas não quer ouvir o outro. O caminho é não impedir ninguém de falar, o caminho é ser paciente para ouvir à todos. Se a palavra discussão é tomada como briga, atrito, desrespeito...temos que evitar discutir mas devemos tomar essa palavra como sinônimo de diálogo, bate-papo, troca de ideias, de espaço para dúvidas e perguntas. Todo questionamento é proporcional ao nosso estágio intelectual e moral, por isto nenhum questionamento é idiota. Questionem sempre que preciso e tiverem vontade!!. O caminho é construir uma fala e uma interação respeitosa, tolerante à diversidade. O ódio, seja ele religioso ou laico, não é o caminho, nem o ódio de “deus”, nem das pessoas, nem dos ateus, nem dos negros, nem dos gays...

Mesmo que seja um tema “complicado” é de extrema importância não reprimirmos nosso diálogo sobre este e nenhum outro assunto. E a repressão é tamanha que ainda não sabemos nem mesmo pautar a questão sem nos inflamar, sem ficarmos apaixonados, emocionados, exaltados..apelar, xingar, sair dos grupos em que se dialoga....

E cada um de nós não só podemos e devemos pensar no que quisermos como não devemos nos esquecer que não se trata nem mesmo de uma permissão pois em última instância cada um é o dono de sua própria mente e por isto os critérios para definirmos que crenças acolheremos como verdadeiras e quais não também é uma decisão individual. Alguns preferem acreditar na razão&experiência do que acatar a fé. Na razão e na experiência podemos conseguir convergência mais ampla e mais duradoura. Pela fé, ainda não vislumbro critérios públicos a se utilizar.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Deus NÃO está morto! - Comentários sobre o filme por Antonio Marques


  • Ao contrário do que o filme diz a ciência não provou que deus existe e provar que deus não existe não é possível,, assim como não é possível provar a inexistência de qualquer outra coisa,, se não determinarmos as coordenadas espaciais. Pesquise sobre: “ônus da prova”.
  • Se deus criou o universo, quem criou deus? E quem criou o criador de deus?......Mas se esta questão não é uma questão para os cristãos, pois para eles Deus é incriado e eterno, então além de provar a existência de deus, resta provar como é possível um ser eterno, pois isto também contraria a ciência. Um pouco mais sobre Bíblia e Ciência, ver:http://www.bibliadocetico.net/ciencia.html.
  • A filosofia e a ciência podem não saber porque o Big Bang aconteceu, pois elas aceitam que mais ignoram do que conhecem, nem por isso, preenchem as lacunas de suas ignorâncias com qualquer tipo de resposta.
  • Ao contrário do que o filme tenta nos fazer acreditar, a imensa maioria das pessoas possuem fé, e defender o ateísmo ou o agnosticismo é muito mais difícil e demanda muito mais coragem do que defender o fideísmo, o teísmo e o cristianismo. Se precisa muito mais coragem para dizer que não se tem fé do que para dizer que se tem.
  • O filme apesar de supostamente se utilizar de argumentos lógicos e da ciência, o faz apenas quando convém. O fato da maioria das pessoas acreditarem numa coisa, não é a prova de que esta coisa existe. A verdade não é uma questão de maioria. Pesquise sobre a falácia chamada “apelo ao povo” (ad populum).
  • Se deus permite que o mal existe por causa do livre-arbítrio, é preciso explicar como é possível conciliar o livre arbítrio com a onisciência divina. Também explicar com é possível um deus bondoso dar livre-arbítrio sabendo que as consequências desse suposto livre arbítrio tem sido muito danosa para a humanidade. E por último como explicar o mal que acontece com crianças, que em tese não tem maturidade para ter livre-arbítrio e nem defesa eficaz com o mal uso do livre-arbítrio dos adultos.
  • No filme, o amor de deus não é incondicional, está condicionado, baseado numa lógica de reciprocidade, apenas nos salva se o aceitarmos, caso contrário nos condenará ao sofrimento eterno. O nome disto não é amor, o nome disto não é liberdade, o nome disto é chantagem.
  • Deus existindo ou não, nem tudo é permitido, porque vivemos em sociedade. Não é preciso nenhuma religião, nem crença em seres sobrenaturais para ser ético. A empatia é um sentimento independente da fé. O filme é desonesto ao ter dois ateus maus (empresário e professor) quando se sabe que a esmagadora maioria do planeta crê em deus e portanto a maior parte da maldade no mundo não vem dos ateus. Há pessoas muito más que são atéias, mas também há pessoas muito más que são religiosas: cristãs, islâmicas,.... Se mata muito mais em nome de deus do que em nome de qualquer outra coisa. Há ótimas pessoas que são religiosas, há ótimas pessoas que são atéias. O desejo de fundo, no filme, inclusive, é de alguma forma a morte dos ateus. O filme termina com o atropelamento do professor de filosofia.
  • O que o professor de filosofia faz em sua aula é uma falta de ética, já que ele “obriga” as pessoas a declararem-se atéias. Isto não é e nunca foi fazer filosofia. Um professor de filosofia e qualquer outra pessoa tem direito de não crer em nenhum deus, nem por isso ele deve deixar de ensinar, da melhor maneira que pode, os filósofos que não concorda, entre eles os filósofos cristãos. No Brasil, pelo menos, a liberdade de crença é um direito constitucional.
  • O filme menospreza a causa do vegetarianismo. E isto é triste porque nenhum ser capaz de sofrer, deveria nem morrer, nem sofrer apenas para satisfazer nosso paladar. Este é um dos problemas da fé, ela nos exime da reflexão sobre certos aspectos do mundo.

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Apego por Ajaan Brahmavamso



Provavelmente, o termo mais mal compreendido nos círculos Budistas ocidentais é aquele normalmente traduzido como 'apego'. Demasiadas pessoas colocaram nas suas cabeças que elas não devem estar apegadas a nada. Alguns pseudo-Budistas equivocados criticam aqueles que vivem uma vida baseada em princípios morais como tendo apego aos preceitos e, assim louvam as ações imorais como um sinal de profunda sabedoria. Outros em círculos Budistas tradicionais disseminam o medo da meditação profunda por incorretamente afirmar que haverá apego aos Jhanas. Tudo isso vai longe demais. Talvez o auge da desinformação maldosa foi dito por Rajneesh que alegou "Eu estou tão desapegado, não estou nem mesmo apegado ao desapego" e, assim, convenientemente justificando todos os seus excessos.

A palavra em questão em pali é upadana, que significa literalmente 'agarrar algo'. É comumente utilizada para indicar o 'combustível' que sustenta um processo, tal como o óleo de uma lâmpada ser o combustível/upadana para a chama. Upadana está relacionado ao desejo (tanha). Por exemplo, tanha seria estender a mão para uma deliciosa xícara de café, upadana seria pegar a xícara. Muito embora pensamos que podemos facilmente soltar da xícara de café pois a mão não está colada nela, ainda assim é upadana. Nós a pegamos. Nós a seguramos.

Felizmente nem todo tipo de apego é anti-Budista. O Buda especificou apenas quatro grupos de upadana: 'apego' aos cinco sentidos, 'apego' a idéias incorretas, 'apego' à idéia de que a libertação pode ser alcançada simplesmente através de preceitos e rituais, e 'apego' à idéia da existência de um 'eu'. Há muitas outras coisas que podem ser 'agarradas' ou pelas quais pode haver apego, mas o ponto é que apenas esses quatro grupos conduzem ao renascimento, apenas esses quatro são o combustível para uma existência futura e mais sofrimento, apenas esses quatro devem ser evitados.

Assim, adotar a prática da compaixão, adotar a prática dos cinco preceitos, ou os preceitos maiores de um monge ou monja, e adotar a prática da meditação - essas não são práticas anti-Budistas e é maldoso desencorajá-las classificando-as como 'apegos'. Observar os cinco preceitos é, de fato, o desapego dos desejos mais grosseiros como a paixão, cobiça e violência. Praticar a compaixão é o desapego do egocentrismo, e praticar a meditação é abrir mão do passado, do futuro, dos pensamentos e muito mais. A realização dos Jhanas é nada mais que o desapego do mundo dos cinco sentidos para obter acesso à mente. Nibbana é abrir mão de uma vez por todas da cobiça, da raiva e da delusão, as sementes do renascimento. O parinibbana é o movimento final de abrir mão do corpo e da mente (os cinco khandhas). É errado sugerir que qualquer um desses estágios de abrir mão são a mesma coisa que o apego.

O caminho é como uma escada. Agarramos o degrau acima e abrimos mão do degrau abaixo para puxar-nos para cima. Logo, o degrau que acabamos de agarrar será o degrau no qual estaremos em pé. Será a hora de abrir mão desse degrau ao agarrar um degrau ainda mais alto para elevar-nos ainda mais. Se a pessoa nunca agarrou [1] nada, ela irá permanecer espiritualmente obtusa.

Para aqueles sem sabedoria, o desapego pode muitas vezes parecer apego. Por exemplo, um pássaro empoleirado no galho de uma árvore à noite parece estar firmemente agarrado ao galho, mas na verdade ele está desapegado pois está totalmente adormecido. Quando um pássaro se descontrai e os músculos começam a relaxar as suas garras se fecham no galho. Quanto mais ele relaxa, mais as garras apertam. É por isso que nunca vemos uma pássaro caindo de um poleiro, mesmo quando está dormindo. Pode parecer apego, mas, na verdade é relaxar/abrir mão. Abrir mão muitas vezes leva à quietude, não se mover de onde estamos, sendo por isso, algumas vezes, confundido como apego.

Portanto, não se deixem influenciar por bem intencionados, mas mal informados Budistas novatos que interpretam upadana/apego de forma completamente equivocada. Apeguem-se sem medo aos seus preceitos, ao seu objeto de meditação e ao caminho, pois este conduz a Nibbana. 

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[1] Nota do tradutor: No inglês Ajaan Brahm emprega o termo "grasp" que tem o duplo sentido de "agarrar" e "compreender". Não foi encontrado um termo equivalente em português e assim foi mantido o termo "agarrar".

Fonte: BSWA Newsletter Dezembro 1999.