A Carta Mundial das Mulheres para a Humanidade foi construída nos marcos da 2ª ação internacional da MMM, em 2005, e expressa o mundo que as mulheres querem construir, baseado nos princípios da igualdade, liberdade, justiça, paz e solidariedade.
Preâmbulo
Nós, as
mulheres, há muito tempo marchamos para denunciar e exigir o fim da
opressão que vivemos por sermos mulheres e, para afirmar que a
dominação, a exploração, o egoísmo e a busca desenfreada do
lucro produzem injustiças, guerras, ocupações, violências e devem
acabar.
Das
nossas lutas feministas e das lutas de nossas antepassadas de todos
os continentes, nasceram novos espaços de liberdade para nós, para
nossas filhas e filhos para todas as crianças que, depois de nós,
caminharão sobre a terra.
Estamos
construindo um mundo no qual a diversidade é uma virtude; tanto a
individualidade como a coletividade são fontes de crescimento; onde
as relações fluem sem barreiras; onde a palavra, o canto e os
sonhos florescem. Esse mundo considera a pessoa humana como uma das
riquezas mais preciosas. Um mundo no qual reinam a igualdade, a
liberdade, a solidariedade, a justiça e a paz. Este mundo nós somos
capazes de criar. Constituímos mais da metade da humanidade. Damos a
vida, trabalhamos, amamos, criamos, militamos, nos divertimos.
Garantimos atualmente a maior parte das tarefas essenciais para a
vida e a continuidade da humanidade. No entanto, nessa sociedade
continuamos sendo oprimidas.
A Marcha
Mundial das Mulheres, da qual fazemos parte, identifica o patriarcado
como sistema de opressão das mulheres e o capitalismo como sistema
de exploração de uma imensa maioria de mulheres e homens por parte
de uma minoria.
Esses
sistemas se reforçam mutuamente. Eles se enraízam e se conjugam com
o racismo, o sexismo, a misoginia, a xenofobia, a homofobia, o
colonialismo, o imperialismo, o escravismo e o trabalho forçado.
Constituem a base dos fundamentalismos e integrismos que impedem às
mulheres e aos homens serem livres. Geram pobreza, exclusão, violam
os direitos dos seres humanos, particularmente os das mulheres, e
põem a humanidade e o planeta em perigo.
Nós
rejeitamos esse mundo!
Propomos
construir outro mundo, onde a exploração, a opressão, a
intolerância e as exclusões não existam mais; onde a integridade,
a diversidade, os direitos e liberdades de todas e todos são
respeitados.
Esta
Carta se baseia nos valores de igualdade, liberdade, solidariedade,
justiça e paz.
IGUALDADE
1. Todos
os seres humanos e todos os povos são iguais, em todos os domínios
e em todas as sociedades. Eles têm igual acesso às riquezas, à
terra, a um emprego digno, aos meios de produção, a uma moradia
adequada, à educação de qualidade, à formação profissional, à
justiça, a uma alimentação saudável, nutritiva e suficiente, a
serviços de saúde física e mental, à segurança durante a
velhice, a um meio ambiente saudável, à propriedade, a funções de
representação política e de tomada de decisões, à energia, à
água potável, ao ar puro, aos meios de transporte, às técnicas, à
informação, aos meios de comunicação, ao lazer, à cultura, ao
descanso, à tecnologia e às inovações científicas.
2.
Nenhuma condição humana ou condição de vida justifica a
discriminação.
3. Nenhum
costume, tradição, religião, ideologia, nenhum sistema econômico
ou político justificam que uma pessoa seja posta em situação de
inferioridade, nem permitir atos que ponham em perigo sua dignidade e
integridade física e psicológica.
4. As
mulheres são cidadãs de pleno direito, antes de serem cônjuges,
companheiras, esposas, mães, trabalhadoras.
5. As
tarefas não remuneradas, ditas femininas, que garantem a vida e a
continuidade da sociedade (trabalhos domésticos, educação, cuidado
das crianças e dos familiares) são atividades econômicas que criam
riqueza e que devem ser valorizadas e partilhadas.
6: Os
intercâmbios comerciais entre países são eqüitativos e não são
prejudiciais ao desenvolvimento dos povos.
7. Cada
pessoa tem acesso a um trabalho remunerado justamente, efetuado em
condições seguras e salubres que a permitam viver dignamente.
LIBERDADE
1. Todo
ser humano vive livre de todo tipo de violência. Nenhum ser humano
pertence a outro. Nenhuma pessoa pode ser objeto de escravidão, ser
forçado ao casamento, ser submetida a trabalhos forçados, ser
objeto de tráfico e de exploração sexual.
2. Cada
pessoa goza de liberdades coletivas e individuais que garantem sua
dignidade, em especial: liberdade de pensamento, de consciência, de
crença, de religião; de expressão, de opinião; de viver
livremente e de maneira responsável sua sexualidade, de escolher a
pessoa com quem partilhar sua vida; de votar, de ser eleita, de
participar na vida política; de se associar, se reunir, se
sindicalizar, se manifestar; de escolher seu domicílio, sua
nacionalidade, de escolher seu estado civil; de seguir os estudos de
sua escolha, de escolher sua profissão e exercê-la; de se mudar, de
dispor de sua pessoa e de seus bens; de escolher seu idioma de
comunicação respeitando as línguas prioritárias e decisões
coletivas quanto à língua de uso e de trabalho; de se informar, de
aprender coisas novas, trocar idéias e ter acesso às tecnologias de
informação.
3. As
liberdades se exercem na tolerância e no respeito à opinião de
cada pessoa, e dentro de parâmetros democráticos e participativos.
As liberdades acarretam responsabilidades e deveres para com a
comunidade.
4. As
mulheres tomam livremente as decisões no que se refere ao seu corpo,
sua sexualidade e sua fecundidade. Elas decidem por si mesmas ter ou
não filhos.
5. A
democracia se exerce se há liberdade e igualdade.
SOLIDARIEDADE
1. A
solidariedade internacional é promovida entre as pessoas e os povos
sem nenhum tipo de manipulação ou influência.
2. Todos
os seres humanos são interdependentes. Partilham o dever e a vontade
de viver juntos, de construir uma sociedade generosa, justa e
igualitária, baseada no exercício dos direitos humanos, isenta de
opressão, de exclusões, de discriminações, de intolerância e de
violências.
3. Os
recursos naturais, os bens e os serviços necessários para a vida de
todas e de todos são bens e serviços públicos de qualidade aos
quais cada pessoa tem acesso de maneira igualitária e eqüitativa.
4. Os
recursos naturais são administrados pelos povos que vivem nos
territórios onde eles se encontram, de respeitando o meio ambiente e
atuando para sua preservação e sustentabilidade.
5. A
economia de uma sociedade está a serviço daquelas e daqueles que a
compõem. Ela é dirigida à produção e intercâmbio das riquezas
socialmente úteis, que são distribuídas entre todas e todos, que
garantem principalmente a satisfação das necessidades coletivas,
eliminam a pobreza e asseguram um equilíbrio entre o interesse geral
e os interesses individuais. Ela garante a soberania alimentar. Ela
se opõe à busca exclusiva do lucro e à acumulação privada dos
meios de produção, das riquezas, do capital, das terras, das
tomadas de decisão nas mãos de alguns grupos ou de algumas pessoas.
6. A
contribuição de cada uma e de cada um para a sociedade é
reconhecida e independente da função que ocuparem todas as pessoas
gozam de direitos sociais.
7. As
manipulações genéticas são controladas. Não existe direito de
propriedade sobre o ser vivo nem sobre o genoma humano. A clonagem
humana é proibida.
JUSTIÇA
1. Todos
os seres humanos, independente de seu país de origem, de sua
nacionalidade e de seu lugar de residência, são considerados
cidadãs e cidadãos com plenos direitos humanos (direitos sociais,
econômicos, políticos, civis, culturais, sexuais, reprodutivos,
ambientais) de forma realmente democrática igualitária e
eqüitativa.
2. A
justiça social se baseia em uma redistribuição eqüitativa das
riquezas, que elimina a pobreza, limita a riqueza e garante a
satisfação das necessidades essenciais da vida, e que visa à
melhoria do bem-estar de todas e todos.
3. A
integridade física e moral de todas e todos é garantida. A tortura,
os tratamentos humilhantes e degradantes são proibidos. As agressões
sexuais, o estupro, as mutilações genitais femininas, as violências
específicas contra as mulheres e o tráfico sexual e o tráfico de
seres humanos são considerados crimes contra a pessoa e contra a
humanidade.
4. Um
sistema judiciário acessível, igualitário, eficaz e independente é
instaurado.
5: Cada
pessoa goza da proteção social necessária para garantir seu acesso
à alimentação, ao cuidado, à atenção à saúde, à habitação
adequada, à educação, à informação, e à segurança durante a
velhice. Ela tem acesso à renda suficiente para viver dignamente.
6. Os
serviços de saúde e sociais são públicos, acessíveis, de
qualidade, gratuitos para todos os tratamentos, todas as pandemias,
particularmente para HIV.
PAZ
1. Todos
os seres humanos vivem em um mundo de paz. A paz resulta em
particular da: igualdade entre os sexos, da igualdade social,
econômica, política, jurídica e cultural, do respeito aos
direitos, da erradicação da pobreza que assegure a todas e todos
uma vida digna, isenta de violência, onde cada pessoa tem um
trabalho e recursos suficientes para se alimentar, ter moradia, se
vestir, se instruir, estar protegido na velhice, ter acesso aos
cuidados necessários.
2. A
tolerância, o diálogo, o respeito da diversidade são garantias da
paz.
3. Todas
as formas de dominação, de exploração e de exclusão de parte de
uma pessoa sobre outra, de um grupo sobre outro, de uma minoria sobre
uma maioria, de uma maioria sobre uma minoria, de uma nação sobre
outra são excluídas.
4. Todos
os seres humanos têm o direito de viver em um mundo sem guerra e sem
conflito armado, sem ocupação estrangeira nem base militar. Ninguém
tem direito sobre a vida ou morte das pessoas ou dos povos.
5. Nenhum
costume, tradição, ideologia, religião, sistema econômico nem
político justificam violências.
6. Os
conflitos armados ou não entre os países, comunidades ou povos são
resolvidos pela negociação que permite encontrar soluções
pacíficas, justas e eqüitativas em nível nacional, regional e
internacional.
CHAMADO
Esta
Carta Mundial das Mulheres para a Humanidade faz um chamado a todas
as mulheres e homens e a todos os grupos oprimidos do planeta a
proclamarem individual e coletivamente seu poder para transformar o
mundo e modificar radicalmente as relações existentes e
transformá-las em relações baseadas na igualdade, na paz, na
liberdade, na solidariedade e na justiça. Ela chama todos os
movimentos sociais e a todas as forças sociais a agir para que os
valores que defendemos nesta Carta sejam verdadeiramente postos em
prática, e para que as instâncias de poder político tomem todas as
medidas necessárias para sua aplicação.
Ela faz
um chamado à ação imediata para mudar o mundo!
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